terça-feira, 19 de abril de 2011

Hipocrisia e humor

Sou meio avesso a piadas, especialmente aquelas sem graça que já ouvimos inúmeras vezes, contadas pelos mesmos piadistas, em situações que a platéia é obrigada a rir, para agradar e ficar socialmente correta. Alguns que me conhecem mais de perto me acham chato e ranzinza, por esta característica, mas não gosto mesmo, prefiro não fingir. Fico com a sensação de estar perdendo tempo. Também fujo dos programas humorísticos de TV com suas piadas chulas e preconceituosas.
Um amigo me mandou este texto (sem autoria) que circula pela internet. Gostei muito e compartilho, pois considero um humor inteligente, espirituoso, que foge ao lugar-comum. Além de desarmar e fazer pensar, mostra de forma surpreendente, o lado humano que a hipocrisia teima em esconder, mas que termina aparecendo; hipocrisia que não é exclusiva de nenhuma religião, partido político ou qualquer outro agrupamento social, é própria da condição humana.

Gilvan Almeida

Perdão aos 98 anos

Na missa das seis horas do domingo passado, o padre perguntou aos fiéis, ao final da homilía:
- "Quantos de vocês já conseguiram perdoar seus inimigos?"
A maioria levantou a mão. Para reforçar a visão do grupo, ele voltou a repetir a mesma pergunta e então todos levantaram a mão, menos uma pequena e frágil velhinha que estava na segunda fileira, apoiada numa enfermeira particular.
- "Dona Mariazinha? A senhora não está disposta a perdoar seus inimigos ou suas inimigas?"
- "Eu não tenho inimigos!" respondeu ela, docemente.
- "Senhora Mariazinha, isto é muito raro!" disse o sacerdote. E perguntou: "quantos anos tem a senhora?
E ela respondeu: - "98 anos!"
As pessoas presentes na igreja se levantaram e aplaudiram a idosa, entusiasticamente.
- "Doce senhora Mariazinha, será que poderia vir contar para todos nós como se vive 98 anos e não se tem inimigos?"
- "Com prazer", disse ela.
Aí aquela gracinha de velhinha se dirigiu lentamente ao altar, amparada pela sua acompanhante e ocupou o púlpito. Virou-se de frente para os fiéis, ajustou o microfone com suas mãozinhas trêmulas e então disse em tom solene, olhando para os presentes, todos visivelmente emocionados:
- "Porque já morreram todos, aqueles filhos da puta!"

Mandei-o para alguns(mas) amigo(a)s, e recebi alguns comentários. A seguir alguns deles:

-“Esperei pela fala da velhinha, achando que ela faria um discurso dizendo que não é bom ter inimigos e coisa e tal; de repente, ela se mostra mais humana do que todos os que estavam na igreja, mostrando que a idade vem desmistificando algumas ilusões. Imagina como ficou a cara do padre e a dos beatos...”

-“Demonstra algo de verdadeiro ali dentro da igreja, ou seja, vejo um ponto a mais na escada da tão falada evolução: a gente ser verdadeiro naquilo que é. Outro ponto é relembrar o momento em que Jesus diz “atirai a 1ª pedra aquele que não tiver pecado”. Quem é que estava sendo ali mais verdadeiro? Creio que a mulher adúltera, pois o restante tinha pecado mas não estava dando a cara prá bater. É mais fácil apontar os pecados dos outros.
Todos somos pecadores mas na hora de se mostrar, a maioria diz que é mentira, que inventaram, que é conversa sem cabimento, inveja de quem falou. Bem, são tantas interpretações, né amigo? Viva aquele que vai prá guilhotina sendo verdadeiro. Isso prá mim é um grau.”

-“Que doçura de velhinha!”

-“Ainda que pareça uma piada temos na velhinha a mais profunda noção do rancor, da dificuldade de perdoar seus desafetos.”

-“Por essa eu não esperava, mas adoro pessoas com senso de humor.
É realmente difícil não ter inimigos, sei lá, acho que todas as pessoas gostariam de ser bem vistas e amadas por todos, mas os comportamentos humanos são tão distintos e muitos acreditam (e julgam) que não sendo igual a si próprio merece desprezo, às vezes inveja ... e por aí vai ... tem pessoas que você mal vê na vida, tem certeza que nunca falou nada que pudesse tê-la magoado ou algo que valha, e que simplesmente lhe detestam ... complicado o ser humano ... Quê fazer? Talvez esperar 98 anos .... risos.”

-“Melhor perdoar logo, vai lá que a gente não chegue aos 90.”

Um comentário:

Henrique Boechat disse...

a mensagem da senhora é a mesma daquela fábula do menino que foi o único a reparar que o rei estava nú.